Dia 7, de não sei quantos...

Estella - Torres del Rio: 30 km

Fui o último a sair do albergue, então não deu para usar meu instinto de rebanho no momento de decidir para que lado ir. Liguei Google maps, claro. Choviscava. Toca a parar, retirar tudo, pegar a capa, etc, etc. Fui para o lado direito do albergue, depois de uns minutos vi um homem com capuz, mochila grande e relaxei. Depois de 3 a 4 minutos seguindo o jovem, ele entrou numa escola. Obviamente. Liguei o Maps de novo e voltei no sentido oposto. Meia hora depois, encontrei peregrinos mais confiáveis. 

O "beijo", na saída de Estella.

Uns quilômetros adiante, cheguei à Bodega Irache e a sua famosa fonte de vinho.

E continuamos, em direção à subida do dia, para chegar a Villamayor de Monjardín.

Na saída de Villamayor, conheci o Craig, de Byron Bay, a cidade mais a leste da Austrália. Ele estava preocupado com um dedo do pé direito, porque acha que se machucou na 1a etapa.

Seguiu-se uma das conversas mais interessantes da minha caminhada, sobre religião, ciência, raça, medos, orgulho, diferenças, história, surfe, tênis, Deus, a verdade, o Caminho, etc. E a melhor parte foi quando ele confessou que falava com os dedos do pé "you guys need to help that dude that is hurting. Come on. Show some brotherly love for each other!". Depois de rir com ele, eu também confessei que desde Puente de la Reina que falo com os meus pés, também. Na base "bora, galera! Tá bom assim. Ceis que mandam, mas seria massa demais se me levasse sem dor até o destino. Eu sei que vocês podem. Hidratei, fiz massagem e passei creme com cânfora, ontem. Foi bom, né? Então…". Aí, de hora em hora dou um "obrigado, obrigado galera. Tá bom demais. Bora. Falta pouco!". É isso. Isto que so estamos no 3o ou 4o dia de caminhada. Quando chegar a Santiago, cada parte do meu corpo terá nomes, provavelmente. E historias de relacionamento, porque não? Tipo, porque o ombro direito nunca trocou uma palavra com o pé esquerdo…

Depois o Craig ficou para trás, porque queria descansar. Demos um abração, mandei a foto para ele e segui. 

Uma regra não explícita do Caminho é que absolutamente ninguém fica chateado se você não quiser conversar, se você não quiser esperar, se você tiver vontade de ouvir música, etc. Em algum momento, provavelmente nos encontraremos de novo. Ou não. E está tudo bem. Mais uma lição para a vida.

Cheguei em Los Arcos. E uma cidade em que muitos peregrinos para, preferindo fazer uma etapa maior no dia seguinte.

Segui o conselho de um peregrino francês e entrei na igreja. Absolutamente impresionante, o trabalho meticuloso.

Como eu me sentia bem e os pés estavam colaborando, decidi continuar até Torres del Rio, 9 km na frente. Mas fiz uma merecida pausa para almoçar e dar um descanso aos pés.

No trecho final para Torres, conheci a Petra, uma senhora de 60 anos, de origem alemã, naturalizada estadounidense, que está fazendo o Caminho pela primeira vez desde que faleceu o marido, companheiro de 20 anos. Caminhamos juntos uns 5 km, até alcançarmos a amiga, que também perdeu o esposo, com quem ela viajava. Contou como ela é o marido se conheceram no Caminho, décadas atrás, e se casaram, nunca tiveram filhos porque basicamente viajaram o mundo. Ela disse que era dona da empresa dela, algo relacionado com engenharia ambiental, largou tudo e foi ser feliz viajando o mundo com o marido e contando histórias sobre o Caminho. 

Coincidentemente, ficamos no mesmo albergue bosta, então aqui está ela.

Antes de chegar no albergue, cantei, gritei, chorei, ri, pensei, lembrei, chorei de novo, tudo isso, até que finalmente, Torres del Rio apareceu, como um oásis.

Chegamos ao albergue, mantido por um espanhol mais mal humorado do que garçon parisiense, mas tivemos direito a show, durante o jantar medieval.

Aqui, o neo-medieval que nos serviu a pseudo-paella. E a sobremesa foi um horroroso arroz doce, o que para mim é tipo, duas vezes mau.

E por hoje é isso. Amanhã vamos para Logroño!

Paz!