O mundo sem Michael...(1/3)

Como o tempo voa. Já vão dois anos desde a morte do Michael. É impressionante o buraco que ele deixou. Não que a produção artística dele nos últimos anos tivesse sido muita coisa. Eu desliguei dele um pouco depois do HIStory, salvo erro. Ou antes mesmo, não me lembro. Como muitos, acabei por apenas acompanhar a loucura mediática à volta dele – processos, operações, pele cada vez mais branca, crianças, Neverland... enfim.

Cresci com Michael. Sem dúvida. Em Bissau, eu lembro-me bem que festa não era festa que não tocasse pelo menos duas ou três do Thriller. Com o recuo do tempo era surreal ouvir aquele som lá. Imaginem um país africano, recém saído do jugo colonial (em 74), ainda cheio de esperanças e motivações. Até aos meus 12 anos só ouvíamos música africana/antilhesa ou a MPB:
  • Guiné-Bissau: essencialmente José Carlos Schwarz, Zé Manel, Mama Djombo...
  • Cabo Verde: Os Tubarões, Bana... (tudo isso antes de entrarem à batatada, quando ainda se consideravam povos irmãos)
  • Outras musicas negras: Bob Marley, Alpha Blondy (até hoje arrepio-me ao som de Brigadier Sabari), Bonga, Coupé Cloué...
  • Brasil: Chico, Caetano, Bethânia, Gal, Jorge Ben..
Nessa altura eu nunca tinha ouvido uma guitarra com distorção na vida. Tinha ouvido falar muito pouco de Beatles e um pouco do pop dos anos 60, muito por influência dos anos que os meus pais passaram a estudar fora da Guiné. Quando Thriller chegou a Bissau (capital da Guiné, onde morávamos) foi uma febre. Aquele ritmo, aquela guitarra distorcida (nem fazia idéia que aquele som era uma guitarra. Para mim podia ser um teclado qualquer. Na parte do solo podia ser até um violino...), a dança...não havia uma criança/adolescente que não soubesse fazer a moonwalk, your truly inclusive. O momento alto de toda a festa que tivesse um mínimo de qualidade era o momento de dançar sobre Thriller, Beat it e Billie Jean. Simples assim.

Do alto dos meus 13 anos, quando fomos para França, não imaginava que Michael era um fenômeno planetário. Interessantemente, num pais onde nem a língua falávamos, a música acabou por ser um fantástico elemento de socialização. Estávamos num liceu internacional, entre crianças de dezenas de culturas e línguas diferentes e no entanto, Michael era unanimidade. Surreal e confortante. É obvio que em França, em 84, fomos impactados por uma dose de música francesa que nunca tinha ouvido, assim como o rock e o blues. Foi nesse momento que conheci Jimi Hendrix e a minha vida mudou, mas isso é outra história. No meio dessa tribo também havia obviamente os “do contra”, que gostava de Prince (porque é que tem sempre de existir uma rivalidade?). Mas tenho quase a certeza que o que nós, estrangeiros pensávamos, era que as pessoas que gostavam de Michael não podiam ser más pessoas. E isso servia de racionalização para fazer amigos. Simples assim.
E eu adoro algumas das músicas mais antigas dele. Não encontrei a versão fantástica do "Who's Loving You", mas fica aqui a minha primeira entrada no Rock. Sim, sim. Daqui eu fui navegando para tras, para conhecer mais. Mas este ritmo, até hoje me dá vontade de pegar a guitarra e dançar :)

Comentários

  1. Aqui no Brasil o processo foi idêntico! Mas o que eu vivenciei com Michael foi um pouco diferente porque como sou de 78, tinha apenas 5 anos quando Trhiller foi lançado. Um dos meus primeiros contatos com ele foi com We Are The World. Daí veio Bad que selou o relacionamento. Esse foi um dos meus primeiros vinis (o primeirão mesmo foi uma trilha sonora do Snoopy) e minha primeira fita cassete (não consigo me lembrar se foi antes ou depois do Bad) foi Hunting High and Low do A-ha. E para curiosidade: meu primeiro cd foi Depeche Mode, seguido de uma coletânea do Queen :-). Depois disso descobri o metal e então o punk - eu tinha lá pelos 14,15. Mas voltando, minha (pré e) adolescência foi recheada de trilhas sonoras internacionais das novelas (precisamos conversar sobre isso, você vai morrer de rir de saber como tivemos acesso ao pop :-)). Ok, de volta ao assunto original, sobre Bad, a partir dele eu comcei o processo de volta no tempo para o deleite de saber que o passado tiraria os Beatles da caixa de pandora. Nota: enquanto eu descobria Michael, meus pais me passavam, por osmose, o gosto por Clara Nunes e Luiz Gonzaga, por exemplo. Eu achava que música brasileira era isso. Até descobrir Meu Ursinho Blau Blau (do Absynhto). Aí veio Menudos, Dominó e pronto. E venero, até hoje, o ecletismo como principal fator para a formação de opinião. Beijos!

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  2. We are the world também foi um marco para mim. Marco que egos gargantuescos podiam se unir para uma causa maior. No outro dia vi um documentário sobre o Bob Geldof conseguiu fazer o Live Aid em 85 (e posteriormente o Live 8), graças ao sucesso do We Are The World. E o Michael esteve na raiz do We Are The World. Ou seja, Michael esteve indiretamente (ou diretamente) ligado à criação do dia do Rock (13 de Julho) :)

    PS: quero saber dessa historia de "como tivemos acesso ao pop" :D

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