Meu pai morreu...

Estou num avião, faltam 4 horas para chegar a Paris, onde ele morava. Encurtando a história, ele teve um AVC em no fim de 2017...ou 2018, que o deixou completamente incapaz. Depois do hospital dizer que não podia fazer mais nada por ele, ele foi colocado pelo governo francês num lar de idosos, com cuidados médicos 24h. E foi lá que, na noite de ontem, descansou. Uso esse "descansou" mais como um alívio para mim do que outra coisa.

A verdade é que desde 2018 que eu me perguntava pelo menos uma vez por semana, se o meu pai ainda habitava aquele corpo que desfinhava. Quando pensava que sim, era só dor e desespero que me vinha. Eu me imaginava naquela situação, lúcido, mas preso num corpo que não me respondia mais, e sem capacidade de comunicar esse desespero e vontade de acabar com tudo para quem o rodeava. E sem capacidade de fazer a "máquina" parar de livre e espontânea vontade. Quando eu achava que ele "já não estava lá", a situação se tornava surreal. Porque esse cuidado todo com aquele corpo, se o meu pai não habitava mais aquele invólucro? "Queremos dar as melhores condições de vida, até ele morrer!". Essa era a função do lar e de toda a sua equipe. Que profissão, hein? Quanto respeito tenho por quem consegue fazer isso. E eles perderam hóspedes durante a pandemia, claro. Como se não bastasse o resto.

Mas é isso. O meu pai morreu. E acabou o sofrimento. Dele e de quem se preocupava com ele. Fica a dor, que dizem que o tempo ameniza. Habituar-se à ausência. As contas que tínhamos a ajustar um com o outro, felizmente acertamos tudo uns poucos anos antes do acidente dele. Ele se foi e não me deve nada e eu não fiquei a dever nada. Levei muito tempo a aceitar que, no meio de tudo que ele foi, no meio de todos os acertos e erros, das gargalhadas e lágrimas, das sintonias e desconexões, não tenho dúvida nenhuma que ele fez o melhor que pôde fazer, com as ferramentas que a vida ou o destino lhe deram. E claro que só entendi muito disso, depois de ser pai. Na minha memória, agora, fica a sensação que ele me fez rir incomparavelmente mais vezes do que me fez chorar. O ser humano tende a se fixar no que é mau, somos meio voyeuristas como quando diminumos quase inconscientemente velocidade para ver o acidente na estrada. Mas a realidade é precisamente inversa. O lado bom da vida supera o mau, muito mais vezes. E o meu deixou saudades. Que esteja em paz, seja lá onde estiver agora. E feliz. Meu pai, feliz, era uma coisa linda de se ver...

Comentários

  1. Es um amor de pessoa. Fuzeste me chorar. E como dizes - o que foi bom é muito mais do que o que nao foi tao bom...
    Ja vi partir nesta vida tanta gente...mas custa sempre. Que a memória nao nos falte para que as recordações estejam sempre connosco. Beijinhos meu primo querido.

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    Respostas
    1. Um beijo grande, prim@ não identificada :)

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    2. Oi primaço... sou a Tchubas. Não sei pq não fiquei identificada...coisas desta coisa.... Beijinhos e abraços para ti e Família com SAUDADES

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