Ela tinha 35 anos...

Estava grávida do seu terceiro filho. Ela já tinha um casalzinho – gêmeos – espetaculares. Eu acompanhava distraidamente a vida da família dela, como fazemos agora, pelo feed do Instagram. No caso dela fazia ainda mais sentido porque ela era apaixonada por fotografia. Todos saudáveis, casamento aparentemente sólido e repleto de carinho e cumplicidade. Conheci o marido no dia do casamento deles, ao qual eu fui convidado, junto com um grupo de colegas de trabalho, há dez anos atrás. Ela era divertidíssima, cheia de ironia, vibrante. Eu lembro-me dela com muita vida, “irrequieta”, como uma criança traquina, mas sem maldade nenhuma. Sempre disposta a ajudar, mesmo quando não podia ou dominava o assunto. Vislumbro ela como alguém que se desdobrava para os amigos, os amores, a família etc. E o que eu vislumbro não pode estar muito longe da realidade, dada a forma como amig@s e conhecido@s em comum falam dela.

Eu compartilhei uma sala com ela e mais pessoas, durante uns 2 anos, por volta de 2009, 2010, 2001, se a memória não me falha. Foi o suficiente para ela deixar uma marca na minha vida. Longe de dizer que éramos próximos. Como eu disse acima, eu só seguia a vida dela via Instagram e sei que aqui e ali, ela dava um like em alguma coisa que eu postava, seja na conta pessoal, seja na conta da banda.


Mas essa conexão, por mais tênue de fosse, foi mais que suficiente para me fazer perder as forças das pernas quando, anteontem, uma amiga em comum me disse que ela tinha acabado de ser intubada, com Covid19. Como assim? Passamos do nada de “está tudo bem!” para “estou perto da morte!”? No mesmo momento me lembraram que ela estava grávida de 7 meses, que o bebé teve de ser retirado da mãe de emergência e que ambos estavam em perigo de morte.

Mas essa conexão, por mais tênue que fosse, me fez chorar convulsivamente durante a minha tentativa de corrida noturna, para digerir as notícias do dia – uns 30 minutos antes eu tinha acabado de saber do falecimento de um chefe anterior, de infarto. Muita dor para um dia só. Pânico, mesmo. O chefe e a colega, no mesmo dia? Não pode ser! E ao terminar a corrida, eu pensava para ela, entre as lágrimas “vamos, você vai sair dessa! Tem muita vida para ser vivida ainda. Isso não faz nenhum sentido. Morrer agora não faz absolutamente nenhum sentido!”. E, obviamente que pensei na minha família. Se me sinto assim com alguém tão distante, como seria com alguém próximo? Não faz sentido. É muita dor. É dor, no limiar do que o ser humano consegue absorver, digerir. Mas é preciso viver, como alguém por aí já deve ter dito ou escrito.

Mas a realidade é essa. Estamos conectados, todos, de alguma forma. Não posso negar o estado de total desespero que me senti. Ela era jovem, cheia de vida, planos, projetos, sonhos. Ela faleceu na manhã de ontem. Ela foi uma das 11 pessoas que morrem ontem, de Covid19, no Distrito Federal. Ela foi se juntar às mais de 300 mil vidas perdidas pelo Brasil, durante esta pandemia.

Mas, repetindo uma frase repetida ad nauseum, apesar de ela incorporar um número, um dado estatístico, ela era a Geisa - ou Geisinha, Zezinha, Cerola, Cabeça, Ju, Judéia, Amor, Mamãe, Ruivona - mãe da Malu, Heitor e Vicente (que rogo pela sobrevivência), esposa do Leopoldo, filha da Maria e do Silas, irmã da Kamila, amiga da Denise, da Veronica, da Cleo, do Luciano, da Alessandra, da Mônica, de uma infinidade de pessoas que terão de se habituar a viver num planeta sem a presença física dela. Sim, só física. Sou agnóstico e acredito que ela está em algum outro lugar, neste momento. Quiçá, ela e o meu irmão se encontrem...

Temos chorado demais...

Comentários

  1. Davi, não te conheço pessoalmente, acho q já ouvi a Geisa e as meninas contarem cas os engraçados desse período e seu nome estar no meio. Mas, me senti muito tocada com a verdade e sensibilidade das suas palavras. Vc conseguiu mostrar a todos a essência da Geisinha. Tomei a liberdade de compartilhar, informando seu nome e o link aqui do blog. Desejo que muitos venham aqui comentar e assim, te abraçar. Sinta-se abraçado, acolhido. Não estamos só ❤ (mas se vc achar errado me avise q retiro a publicação 👍🏼)

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    1. Olá Carla!
      Pode manter, Carla. A Geisa merece isso e muito mais. E quem mais merece o nosso abraço é a familia dela. Que encontrem o conforto para honrar a vida dela. Sinta-se abraçada também!

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  2. Uma grande pessoa 😭uma estrelinha no céu.

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  3. Geisinha era tudo isso e muito mais!!!! Homenagem linda e justa!

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